TRANSPOSIÇÃO DO RIO SÃO FRANCISCO: Agência vê atraso de Estados nas ações para transposição

ANA diz que governos ainda não criaram órgãos para gerenciar distribuição da água

ANA edita resolução para obrigar os Estados a agilizar a criação de órgãos gestores de recursos hídricos e treinar pessoal para administrá-los

Um trabalho de fiscalização da ANA (Agência Nacional de Águas) nos Estados receptores das águas da transposição do rio São Francisco revela, ao menos por ora, a falta de comprometimento desses governos com a abertura dos canais.

Na prática, para receber essas águas, Ceará, Paraíba, Pernambuco e Rio Grande do Norte devem ter pronta toda uma estrutura de gestão, principalmente uma secretaria ou uma agência de recursos hídricos equipada, com pessoal treinado para dar a destinação correta à água e cobrá-la dos consumidores da zona urbana e daqueles que a utilizarem para irrigação.

A eficácia nessa cobrança pelo uso das águas do São Francisco é fundamental para que esses Estados tenham condições de financiar o órgão federal responsável pela infraestrutura dos dois canais da transposição. Esse órgão será criado por meio de uma proposta do Planalto a ser enviada ao Congresso.

"O relatório confirmou nossas preocupações. De uma maneira geral, os Estados estão bem atrasados no cumprimento das suas responsabilidades", disse à Folha o diretor-presidente da ANA, José Machado.

Segundo ele, as obras dos canais não vão ser interrompidas ou modificadas por conta dos atrasos. "Se chegar ao fim do processo e o Estado não tiver feito nada, vamos cair numa crise, num impasse terrível", completou.

Integrada ao PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), a obra está orçada em cerca de R$ 5 bilhões, incluindo projetos de revitalização do rio. Segundo o governo, 12 milhões de pessoas serão beneficiadas.

O trabalho de fiscalização em campo, finalizado no mês passado, levou a agência a antecipar uma série de metas aos Estados, antes previstas em conjunto para 2012.

Um exemplo dessa rédea curta da ANA é a exigência aos Estados para o envio às Assembleias Legislativas, ainda neste ano, de projetos de criação dos órgãos gestores de recursos hídricos.

Os novos prazos foram publicados em resolução da ANA no "Diário Oficial da União" da semana passada. Caso não cumpram esses novos prazos, os Estados podem sofrer sanções -advertências e multas.

Segundo o relatório, a situação mais preocupante é a de Pernambuco. O Estado, segundo a agência, tem até junho para criar uma agência estadual de água, inclusive com a nomeação de seus dirigentes.

Um projeto de lei para isso nem sequer foi encaminhado à Assembleia. O prazo é o final deste ano, assim como a publicação de um edital para contratar novos servidores para a Secretaria de Recursos Hídricos. Paraíba e Rio Grande do Norte aparecem num nível intermediário, com os órgãos gestores criados, mas ainda sem estrutura. O mais adiantado é o Ceará, mas que, mesmo assim, tem prazos a curto, médio e longo prazos redefinidos pela agência reguladora.

"Na outorga [2005] demos prazos finais e, como constatamos atrasos na execução das medidas, preventivamente achamos importante colocar prazos intermediários, para a gente poder fazer uma gestão mais minuciosa, imprimir uma disciplina", disse Machado.

Frase
"O relatório confirmou nossas preocupações. De uma maneira geral, os Estados estão bem atrasados no cumprimento das suas responsabilidades". JOSÉ MACHADO diretor-presidente da Agência Nacional de Águas.

Outro lado: Estados dizem que irão cumprir determinações
Representantes de Ceará, Pernambuco, Paraíba e Rio Grande do Norte disseram ontem que os prazos definidos em resolução da semana passada da ANA serão cumpridos pelos Estados.

Apontado como o mais atrasado, o governo pernambucano promete enviar ainda neste mês à Assembleia Legislativa o projeto de criação da Agência Pernambucana de Água e Clima. "Repactuamos com eles [agência] os prazos exatamente como propuseram. Não ficou nenhum prazo em aberto. Não tenha dúvida [que estaremos preparados]", diz João Bosco de Almeida, secretário de Recursos Hídricos do Estado.

No caso da Paraíba, a justificativa pelo atraso é a recente troca de governo, com a posse de José Maranhão (PMDB) após a cassação de Cássio Cunha Lima (PSDB). "Todos os prazos foram aceitos, pois são factíveis de serem cumpridos", disse o secretário de Recursos Hídricos, Francisco Sarmento.

No Rio Grande do Norte, a promessa é equipar o Instituto de Gestão das Águas do Estado, com a contratação de engenheiros, economistas, químicos, biólogos e sanitaristas, segundo Celso Veiga, diretor do instituto.

No caso do Ceará, o menos atrasado dos Estados, a ideia é fortalecer a estrutura da Companhia de Gestão dos Recursos Hídricos. Segundo Francisco Teixeira, presidente do órgão, 60 novos técnicos devem ser contratados.

Saiba mais: Governo teve obstáculos para tocar projeto
Iniciada em meados de 2007, a transposição do rio São Francisco demorou a tomar vulto. Em janeiro deste ano, a obra se resumia a estacas fincadas no caminho dos canais de distribuição.
Pelo menos quatro meses de atrasos foram previstos pela desistência, em novembro de 2008, da Camargo Corrêa em tocar um trecho de 54 quilômetros da obra.

A empreiteira pediu uma revisão do preço, de R$ 219 milhões, o que foi negado pelo governo federal. Pelo mesmo motivo, a LJA e a Ebisa também abandonaram outro trecho no final de janeiro. Em novembro do ano passado, o TCU constatou "deficiência de licitação das obras". Por conta disso, o tribunal avaliou que haveria atraso na conclusão de 2 dos 14 lotes - elas não ficariam prontas nem com ampliação de 30% do prazo.
Ao todo, 1.998 áreas teriam que ser desapropriadas para as obras. Até janeiro, 1.509 indenizações ainda não haviam sido pagas e 628 proprietários nem sequer tinham título das terras.

Dezenas de liminares motivadas por críticas ambientais e sociais também impediram o andamento das obras. Movimentos sociais, ONGs e comunidades viam riscos de desmatamento da vegetação próxima aos rios, evaporação da água canalizada, falta de sistemas de abastecimento nos municípios para fornecimento à população e domínio de latifundiários sobre a água distribuída.


Comentários

  1. Pois, começaram mais uma obra se "esquecendo" da Engenharia Institucional... Lamentável!

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